Em
um dia em que desastres ambientais e mudanças climáticas concentraram atenções
no 8º Fórum Mundial da Água, em Brasília, especialistas do Brasil e do Exterior
reservam espaço para também debater o tema “Práticas de conservação da água e
do solo para melhor produção alimentícia”. A sessão de discussão concluiu que
conservação de água e solo andam de mãos dadas e que a preservação desses
insumos é extremamente importante para garantir alimentação para uma população
mundial que segue em crescimento. Projeções da Organização das Nações Unidas
(ONU) indicam que a população mundial chegará a 8,6 bilhões até 2030, um
aumento de 1 bilhão de pessoas em 13 anos, chegando a 9,8 bilhões em 2050 e
11,2 bilhões em 2100.
A
pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Maria de
Lourdes Mendonça Santos alertou, nessa sessão de debates, que a atividade
agropecuária não pode ser tratada como “vilã” em relação ao consumo de água.
Para ela, não se pode esquecer que fome zero e agricultura sustentável formam
uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da Agenda 2030 das
Nações Unidas.
“Temos de buscar segurança alimentar com segurança ambiental. Não podemos vilanizar a agricultura, afinal também temos compromissos. E um dos primeiros é acabar com a fome. Temos de produzir alimentos de maneira sustentável, mantendo as funções do solo ao longo do tempo”, destacou Maria de Lourdes. Ela argumentou que já há um amplo conjunto de técnicas disponíveis para proteger água e solo
(desde medidas como evitar deixar o solo descoberto e promover rotação de
culturas). O que falta é implantar todo esse conhecimento, sem deixar de
avançar na pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias.
Para
Maria de Lourdes, é preciso produzir e difundir conhecimento sobre os cuidados
com solo e água, promover efetivamente políticas públicas, garantir
financiamento para pesquisa e implantação e investir educação. A pesquisadora
da Embrapa destaca que embora muitos mecanismos estejam disponíveis, colocar as
soluções em vigor não é tarefa fácil, pois envolve esforços políticos,
técnicos, de crédito e difusão de informações, entre outros fatores. Maria de
Lourdes citou dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura (FAO), os quais apontam que 33% dos solos do mundo estão com
degradação moderada ou alta.
Experiência
estrangeira
O
indiano Ashwin Pandya, da Comissão Internacional de Irrigação e Drenagem, disse
que é preciso aprimorar técnicas atualmente aplicadas, adequando ao máximo os
projetos de irrigação ao tipo de agricultura. Na Índia, explicou, há um sistema
que fornece a pontuação da saúde do solo, em cálculo que envolve fatores como
composição, sustentabilidade e os diversos usos da área. A partir daí,
destacou, são aplicadas as melhores práticas, evitando a degradação hídrica e
dos solos. “É preciso um programa holístico para os cuidados com a água, o solo, o
uso de fertilizantes. A população mundial está aumentando e a terra arável não
está crescendo”, destacou Pandya.
Exemplos
de boas práticas no manejo hídrico foram apresentadas pelo professor da
Universidade de Nebraska (EUA) Charles Wortmann. Ele mostrou resultados obtidos
com técnicas de diminuição do escoamento superficial nas lavouras de países da
África. Em situações específicas, foi obtido aumento de 44% na relação de
produtividade do milho, considerando como parâmetro principal cada metro cúbico
de água aplicada na terra.
Wortmann
também apresentou resultados de pesquisas que evitaram a evaporação da água do
solo. Cada caso, no entanto, depende de estudos e exige aplicações especificas.
Soluções que foram bem-sucedidas em uma região não apresentaram bons resultados
em outras áreas.
O
monitoramento dos solos por satélite também pode ser um bom instrumento para a
preservação das águas e dos solos, apontou o representante da FAO Jippe
Hoogeveen. O sensoriamento remoto amplia a capacidade cruzar dados como
evaporação, disponibilidade de biomassas, nível de precipitação e uso da terra,
entre outros fatores, permitindo uma gestão mais eficaz e equilibrada entre
produção e sustentabilidade.
É
impossível promover a produção de alimentos sem promover a antropização da
paisagem (a modificação da paisagem original, pela presença do homem), lembrou
o secretário de Meio Ambiente do município goiano de Cristalina, Bruno Marques.
Ele argumentou, assim com a pesquisadora Maria de Lourdes, da Embrapa, que o
desafio é encontrar o equilíbrio. “Adotar práticas de conservação da água e do
solo para a melhor produção agropecuária”, disse. Ou seja, o desafio é
alavancar o potencial de produção, mas com a máxima preservação ambiental.
Diante desse cenário, Marques afirmou que é indispensável investir em gestão agroambiental, prática que envolve desde técnicas como a rotação de culturas até o aprimoramento estratégico da gestão das propriedades rurais. “Inserir a variável ambiental é um excelente negócio para quem está na agricultura”, concluiu.