A
indicação de um livro classificado como paradidático na escola do Sesi em Volta
Redonda gerou uma boa polêmica entre pais dos alunos. Tão boa que ganhou
repercussão nacional, após um grupo pedir a retirada do livro da grade e outro
brigar pela permanência. No fim, prevaleceu o grupo da resistência e as
crianças vão ter a chance de conhecer o livro Omo-Oba – Histórias de Princesas,
da editora Mazza e de autoria de Kiusam de Oliveira.
O livro
reconta mitos africanos, divulgados nas comunidades de tradição Ketu, pouco
conhecidos pelo público em geral e que reforçam os diferentes modos de ser
femininos. Dividido em seis mitos, relata as histórias de Oiá, Oxum, Iemanjá,
Olocum, Ajê Xalugá e Oduduá. Está aí o foco da polêmica. As princesas relatadas
no livro não lembram em nada as cinderelas e belas adormecidas. Pelo contrário,
são inspiradas em divindades das religiões de matizes africanas.
De
acordo com a resenha do livro, as princesas são “seis divindades iorubanas,
orixás, cujas histórias de seus poderes são recontadas como se fossem no tempo
da infância delas”. A contação das histórias, as cores das páginas de
cada história e os elementos afrossimbólicos das ilustrações pedem ao leitor
que participe da construção dos sentidos das narrativas.
A
princípio, a gerência de educação básica, responsável pela escolha do material,
resolveu acatar as reivindicações do grupo de pais que pretendia retirar o
livro da escola. Com isso, a troca do título chegou a ser autorizada. Foi então
que uma mãe se levantou e foi para as redes sociais criticar a atitude da
escola. Juliana Pereira de Carvalho, afirmou acreditar que a motivação dos pais
que pediram a saída do livro é discriminatória.
– A
troca em meu entendimento foi motivada por preconceito afro-religioso. Além
disso, acredito ser importante a oportunidade para esclarecer os pais sobre a
existência e o mérito das leis 10.639/ 03 e 11.645/ 08, que obrigam as escolas
públicas e privadas a levarem a história e Cultura africana e indígena à sala
de aula – disse.
Uma
solução “intermediária” foi tentada, pela qual as crianças seriam divididas em
grupos de acordo com as crenças religiosas.
– Por
fim, não concordei com a solução oferecida pela escola, que tinha em sua
metodologia dividir as crianças em grupos de acordo com as crenças dos pais, o
que fomentaria a intolerância – opinou.
Juliana
acredita que se as gerações passadas tivessem lido mais sobre “princesas
negras”, talvez Marielle não tivesse sido executada, tão pouco estaria sendo
vitima até hoje de difamação.
–
Acredito que as representações de princesas africanas São essenciais para o
letramento histórico de nossas crianças, independentemente de suas cores. Faz
parte do ideal de um mundo melhor – diz.
Com
milhares de compartilhamentos, curtidas e comentários, o post de Juliana no
Facebook surpreendeu até mesmo a autora.
– Tive
uma grata surpresa com a repercussão do caso. No entanto, percebo que a
repercussão também é fruto do contexto de intolerância vivido por nós. Conforme
o discurso que ouvi no enterro de Marielle. ‘O dia em que a morte de uma mulher
negra for importante, todas as outras mortes também importarão – concluiu.
Lídia
Vieira Folly, que tem uma filha de oito anos no Sesi, acredita que o livro não
carrega questões religiosas.
– O
livro é, no meu ponto de vista, para desmistificar o padrão de beleza. Sou
evangélica e não vejo isso como uma tentativa de intervir na religião. As
crianças não estão sabendo a polêmica que está causando este livro. Ele vai
trazer uma cultura a mais, e o mais interessante é que fala sobre princesas –
opina a mãe.
Em
nota, a Escola Sesi de Volta Redonda explicou que cometeu um erro ao anunciar
um livro opcional à obra “Omo-oba – Histórias de Princesas”, para alunos cujos
pais questionaram a sua utilização em aulas de História.
“A
instituição vem a público reconhecer o equívoco no tratamento do assunto e
informar que não mais será adotado um livro adicional. Além de cumprir a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação e suas complementações, que tornou obrigatório o
estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena, o Sesi Rio está
empenhado e comprometido com a questão da diversidade cultural, tanto que
adotou em todas as suas unidades, a referida obra como livro paradidático na
disciplina de História. Diante do questionamento de alguns pais se precipitou,
de forma equivocada, ao permitir a troca da obra para aqueles interessados,
procedimento que foi revisto”.
A nota
segue: “O Sesi já entrou em contato com a mãe que se sentiu ofendida com a
promessa de um livro opcional para se desculpar e esclarecer o ocorrido. Além
disso, a escola fez uma reunião com pais e responsáveis para também abordar o
tema. Para que equívocos como o ocorrido não se repitam, o Sesi irá realizar
uma reciclagem com toda a sua equipe pedagógica. A Escola Sesi de Volta Redonda
também promoverá, em breve, um encontro para debater com a comunidade escolar a
diversidade e o multiculturalismo”.